domingo, 19 de janeiro de 2014

Dia treze.

Uma breve reflexão sobre o trabalho gratuito.


Boa parte de nós já se deparou com ofertas de "emprego" completamente absurdas. Aquelas onde a parte dos requisitos tem umas 52 alíneas, pedindo-se lá pelo meio o domínio de quatro idiomas e de sete linguagens de programação informática, disponibilidade total e absoluta para trabalhar 24 sobre 24 horas, todo o empenho, espírito empreendedor, amor à camisola e o nosso melhor sorriso. Se estivermos dispostos a mudar o nosso colchãozinho para o escritório lá da empresa, aí então é que é uma maravilha. Pagamento, já se sabe, zero  afinal de contas, integrar uma equipa "sólida, jovem, motivada e divertida" é privilégio suficiente e algo que deveremos agradecer para o resto da vida. Ordenado? Para quê? O bom ambiente entre colegas é que alimenta a alma. Isso e trabalhar até chegar um provável esgotamento. Nada disto põe é comida na mesa, mas há que saber definir prioridades.

O pior é que estes anúncios são só o princípio do problema. Logo de seguida vem a outra parte: a dos discursos. Há os conformados, os desdenhosos, os acusadores, os ai-que-isso-de-receber-dinheiro-por-trabalhar-é-tão-1995. Uns acham que, de facto, há que aproveitar estas grandes oportunidades, até porque "uma pessoa nunca sabe o que pode vir dali" (e no nosso país é certinho que só virão coisas boas). Outros concluem que se não aceitamos ofertas do género é porque temos mesmo a mania de que somos os maiores. E outros fazem questão de lançar a frase "mais vale pouco que nada" como se fosse uma espécie de recriminação.

Ficar sem emprego dá-nos tempo livre, claro (embora isto nem sempre seja assim tão linear). E se há coisa subtilmente perigosa é uma cabeça desocupada. Mas, assim de repente, ocorrem-me trinta formas diferentes de preencher a vida e a mente. E todas elas bem mais preciosas, para mim e espero eu que para quem me rodeia, do que trabalhar de graça. A ideia de que mais vale trabalhar sem receber do que não trabalhar não me convence; e a suposta "obrigação" de se aceitar tudo quando não se tem emprego, sejam quais forem as condições, convence-me ainda menos.

3 comentários:

  1. Concordo contigo, Sofia. Força.

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  2. "Ai-que-isso-de-receber-dinheiro-por-trabalhar-é-tão-1995" salvou-me o dia.

    Obrigada
    Saudações de uma também desempregada.

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