sábado, 15 de fevereiro de 2014

Dia quarenta.

A minha atribulada relação com a generosidade.


Suponho que este assunto não provoque a mesma reacção em toda a gente. Aliás, seguramente não provoca: há com certeza os que são capazes de ver isto pela perspectiva útil, prática, até conveniente.

Eu não consigo ceder a certas coisas. Por mais que valorize a gentileza (e valorizo), por mais que a nobreza do gesto me sensibilize (e sensibiliza), por mais que compreenda a atitude (que eu própria tomaria sem hesitar se o caso fosse o inverso), há ajudas que sou incapaz de aceitar. Porque envolvem muitos custos, porque resultam de opções minhas, por vergonha, por princípio. Obviamente, há pessoas e pessoas. E, acima de tudo, há ajudas e ajudas: não estou a falar de um lanche, de um bilhete de cinema ou de presentes propriamente ditos. Estou a falar... do resto.

A minha vontade, agora, é usar aquele lugar-comum que costumamos associar a outros contextos: "não és tu, sou eu". Gosto de contar com o que tenho. Apenas e só. A culpa começou por ser dos moldes em que me encaixaram desde pequenina e hoje em dia é também minha. Faço contas à vida consoante as possibilidades que tenho. Digo "sim" àquilo a que posso dizer sim e "não" quando não há alternativa ou quando o "sim" me parece possível mas imprudente tendo em conta as circunstâncias. (E também respondo "não" quando tenho outros planos. Ou quando não me apetece fazer determinada coisa. Quem diz a verdade não merece castigo...)

Escrevo sobre isto porque, mesmo que tudo não passe de um equívoco e que a minha recusa não se deva propriamente ao ar em excesso na minha carteira, estando eu desempregada a associação habitual é essa. E muitas vezes nem vale a pena explicar que a questão não está no dinheiro, porque quem ouve acha que isso é apenas uma desculpa.

A prova de que vivo rodeada de gente boa e generosa está na frequência com que surge, após o meu "não", um "mas eu ajudo-te", um "mas pago eu", um "mas eu compro". E em certos casos essa disponibilidade é de tal forma sincera que se torna francamente comovedora.

Eu é que não sei lidar com ela. Nem tão-pouco aceitá-la.

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